Engenharia digital pode até parecer discurso repetido de congresso tecnológico, mas a verdade é que empresas de engenharia industrial que não abraçarem esse conceito estão prestes a se tornarem obsoletas. Você que projeta fábricas, linhas de produção ou plantas de processo para seus clientes do setor industrial, seja petroquímico, de alimentos, óleo e gás ou qualquer outro ramo, precisa encarar com urgência a realidade de que o método tradicional, baseado em pranchetas virtuais e trocas infinitas de arquivos desatualizados, não atende mais às demandas de prazos apertados, qualidade rigorosa e exigência de redução de custos. Não é só sobre ter o melhor especialista em tubulações ou em estruturas metálicas; é sobre liderar um time multidisciplinar que domine ferramentas digitais integradas, capazes de conversar entre si em tempo real e de oferecer respostas rápidas às constantes mudanças de escopo que o cliente pede. Ou a sua empresa assume esse rumo agora, ou corre o sério risco de se ver atropelada por competidores mais conectados, que entregam resultados mais ágeis e confiáveis.

Os velhos desenhos em papel, as inúmeras revisões à caneta e carimbos de “aprovado” correndo em pilhas de documentos mofados podem até trazer um ar nostálgico para quem sobreviveu à era analógica da engenharia, mas é preciso encarar a realidade: hoje, esse método é praticamente um chamado à obsolescência.

As empresas de engenharia industrial que insistem nesse modelo tradicional – ou em pequenas variações dele – estão desperdiçando tempo, dinheiro e credibilidade. Neste momento, há uma revolução silenciosa, porém implacável, onde o verdadeiro diferencial não está em desenhar tubulações no AutoCAD ou fazer listagens de materiais em planilhas, mas em estruturar todo o fluxo de trabalho em modelos inteligentes, integrados e alinhados com as necessidades reais da obra, do cliente e da fase de compras.

E não falo de algumas pinceladas de modernidade, como trocar o papel por PDFs soltos, mas da adoção de processos BIM robustos, sustentados por captura da realidade com laser scanners, drones, softwares de automação de projeto e plataformas colaborativas. Quem ainda acha que isso é moda passageira vai ficar para trás, testemunhando seus concorrentes pegarem contratos cada vez maiores – e mais lucrativos.

Por mais que se fale em BIM há anos, muitas empresas ainda não compreenderam o que “Building Information Modeling” realmente significa quando aplicado a plantas industriais ou grandes obras de infraestrutura. O ponto central não é um software específico, mas sim a capacidade de gerar e manipular modelos 3D carregados de informação, capazes de dialogar com outros sistemas e, sobretudo, de se manterem vivos ao longo de todo o ciclo de vida do empreendimento.

Isso elimina o fetiche pelos desenhos bidimensionais que, além de serem pobres em termos de representação, ficam facilmente desatualizados. Em BIM, cada elemento – coluna, viga, tubo, equipamento – carrega consigo dados geométricos, técnicos, de custo, de cronograma e até de manutenção futura. Em vez de termos “um desenho”, passamos a ter uma réplica digital do que será ou do que já é construído. Cada mudança reflete em todas as vistas, evitando aquela loucura de ficar atualizando manualmente plantas e cortes.

Aumentar ou diminuir dois metros na tubulação principal não é mais um drama, porque o modelo se reajusta e quem estiver conectado à plataforma recebe as atualizações quase em tempo real. Isso sem contar a coordenação de interferências, que deixa de ser um exercício de adivinhação para se tornar um processo automatizado: se há um cruzamento entre um duto de ar e um feixe de cabos, o software acusa logo no início, evitando a briga entre equipes que só perceberiam o problema lá na frente, no canteiro, gerando retrabalho e atrasos custosos.

A provocação começa quando a gente percebe que muitas empresas ainda estão estacionadas no “CAD 3D” básico, que não possui informação integrada alguma. Acham que trabalhar em 3D é suficiente para dizer que adotam BIM ou processos digitais avançados. Mas se esse 3D for apenas uma geometria burra, sem dados de material, especificação, custo ou vínculos com o cronograma, sinto dizer que não há muito avanço real. É só um desenho mais moderninho.

O verdadeiro salto ocorre quando a modelagem deixa de ser mero visual e passa a sustentar decisões de engenharia, compras e execução de obra. Em um fluxo verdadeiramente integrado, o engenheiro não fica mais enclausurado em sua disciplina, gerando seus “desenhos” para depois soltar para o departamento de compras. Em vez disso, existe um modelo único, no qual o setor de suprimentos consegue enxergar automaticamente o quantitativo de cada item, as datas em que esses itens serão instalados no cronograma 4D (que vincula o tempo ao modelo) e até o custo acumulado no 5D. É uma verdadeira orquestra, onde cada mudança em um componente repercute na orquestra inteira. Agora, se alguém acha que esse cenário é complicado, é porque ainda não entendeu a magnitude da transformação que a indústria vem sofrendo. É mais complexo? Sem dúvida. Porém, infinitamente mais eficiente.

“Onde se encaixa laser scanners e drones?”

E onde entram laser scanners e drones? Justamente na captura da realidade, que hoje se tornou uma etapa incontornável em reformas, ampliações ou em qualquer situação em que seja crucial conhecer o estado atual do ambiente físico. Muitas empresas ainda confiam em levantamentos manuais, trena em punho ou alguns croquis que não separam o joio do trigo. Quando, afinal, a tecnologia já permite literalmente “escancarar” a realidade e convertê-la em nuvens de pontos detalhadíssimas, com precisão milimétrica.

O laser scanner, posicionado em locais estratégicos, dispara feixes que mapeiam cada canto de uma planta ou edifício, gerando um modelo 3D fiel do estado real. Drones cumprem um papel similar em áreas externas ou pontos de difícil acesso, capturando imagens e transformando-as em modelos fotogramétricos. Num cenário BIM, essa informação de realidade é fundamental para embasar o projeto digital, seja no retrofit de uma fábrica antiga, seja na integração de uma nova linha de processo num galpão já existente. Assim, o “as-built” passa a ser mais do que uma conversa fiada: é um registro fiel, pronto para ser cruzado com o projeto em desenvolvimento.

A coisa fica ainda mais séria quando lembramos de quantas empresas sofrem com prazos apertados, demandados por clientes cada vez mais impacientes. Se antes as revisões de projeto tomavam semanas, hoje não há como fugir de interações muito mais velozes. Se a engenharia não entrega rápido, a concorrência, que já domina processos BIM e digitalizados, assume o contrato. E se a execução de obra encalha por inconsistências no projeto, a conta explode exponencialmente, gerando multas, atrasos de entrega e, em casos extremos, quebras contratuais.

Por isso, a engenharia digital não é apenas “legal” ou “moderna”, é estratégica. Em uma pesquisa divulgada pela McKinsey Global Institute (McKinsey, 2020), o atraso médio em grandes projetos de capital chega a ser de até 20 meses quando não há um processo robusto de integração. Boa parte dessas falhas ocorre por falta de coordenação e divergência de documentação. Com BIM, laser scanning e metodologias colaborativas, esse número despenca. É quase uma escolha: gastar energia apagando incêndios em obra ou investir tempo de forma inteligente na modelagem integrada, antecipando e resolvendo problemas no ambiente virtual.

Automoção

A automação de engenharia também entra em cena e, mais uma vez, expõe a fragilidade de quem ainda vive no papel e no 2D. Em projetos industriais complexos – como linhas de processo químico, plantas de óleo e gás, instalações de papel e celulose, ou mesmo projetos de manufatura avançada –, há miríades de interligações entre equipamentos, tubulações, suportes, instrumentação. A atualização manual disso tudo não é apenas um convite ao erro, mas um suicídio operacional. Os softwares de automação de engenharia permitem que o projetista lance, por exemplo, a linha de tubulação com especificações que já travam o diâmetro, o material e as conexões permitidas, tudo vinculado a um catálogo central.

Quando se muda o tipo de fluido, o sistema acusa que alguns materiais não são compatíveis, evitando erros banais de especificação. Isso se soma a rotinas automáticas de geração de isométricos, listas de materiais, relatórios de carga em suportes, sem que alguém tenha que “desenhar” cada detalhe individual. Se, além de tudo, esse software estiver integrado a um modelo BIM maior, a gente deixa de ter “desenhos” e passa a ter um conjunto de dados vivo, onde a geometria é apenas uma das faces da informação. Soa complexo, mas é justamente isso que garante velocidade e qualidade num mercado implacável. Quem perde horas ou dias “corrigindo” manualmente um isométrico porque a tubulação subiu 30 cm no layout, não percebe que a concorrência faz esse ajuste em segundos, de modo automatizado.

É nesse cenário que surge a demanda por equipes multidisciplinares capazes de dialogar com a tecnologia. Não adianta investir em software e hardware de última geração se a mentalidade continuar presa no passado. Há muitos profissionais experientes que ainda acham que “essa história de BIM e digitalização é exagero”, ignorando que, no canteiro de obras, problemas se acumulam porque alguém não atualizou uma planta ou deixou de enviar o PDF certo a tempo. O convite – ou a provocação – que a indústria faz é: atualize-se ou aceite que seu negócio será relegado a projetos menores, de baixo valor agregado, enquanto as grandes empreitadas ficam para aqueles que realmente dominam a nova linguagem.

E não é por “fetiche de modernidade”: é porque clientes e donos de plantas já entenderam que projetos integrados em BIM, com captura de realidade e automatizações, reduzem retrabalhos, melhoram a qualidade e garantem maior previsibilidade de custos. Eles querem esses benefícios e não estão dispostos a pagar caro por metodologias antiquadas. Se a sua empresa de engenharia ainda oferta “desenhos” em 2D, sem promessa de coordenação digital e sem rastreabilidade, prepare-se para ver a fila de oportunidades minguar.

“E como funciona a execução na prática?”

Pode parecer que esse discurso soa bom em teoria, mas talvez alguém pergunte: “E como funciona a execução na prática?” A execução de obra é onde tudo se comprova. Um modelo BIM bem construído permite que cada equipe de campo receba exatamente a parcela do modelo que precisa. Em vez de ter dezenas de páginas soltas, a construtora ou montadora acessa, em tablets ou sistemas dedicados, uma visão 3D do que deve ser montado, com a sequência de atividades prevista e até o link com o cronograma. Erros de alinhamento ou de altura, tão comuns em instalações industriais, podem ser percebidos rapidamente. O gestor de obra não fica mais perdido em diversas revisões de desenho – se o modelo foi atualizado, todo mundo vê a versão atual e tem clareza do que precisa ser feito. Em escopos de reforma ou expansão, há a sobreposição da nuvem de pontos (vinda do laser scanner) com o modelo.

Assim, é simples verificar se o componente real recém-instalado está no lugar correto ou se algo ficou desalinhado. É uma mudança gritante de paradigma, na qual a conformidade deixa de ser algo que só se descobre no final para ser checada diariamente por meio de ferramentas simples e acessíveis. Alguns podem até dizer: “Mas isso depende de toda a cadeia estar integrada”. Exatamente. Por isso é preciso puxar essa evolução. Alguém tem que dar o pontapé inicial, e as empresas de engenharia, com seus modelos e métodos, são candidatas naturais a liderar o processo, pois elas detêm o conhecimento técnico que permeia todo o ciclo.

E não para aí. A integração entre projeto, compras e obra é outro aspecto revolucionário. De que adianta modelar lindamente em 3D se, quando o setor de suprimentos for fazer os pedidos, não consegue extrair do modelo as quantidades exatas de tubulações, conexões, suportes, perfis metálicos, cabos elétricos? É justamente para isso que o fluxo BIM 5D se propõe: associar, no mesmo “container” de dados, o custo e a quantidade de cada item. Se uma tubulação muda de rota e passa a ter 20 metros a mais, a lista de materiais se atualiza e, consequentemente, o orçamento e o planejamento de compras sofrem os devidos ajustes.

Nada de ficar dependendo de alguém atualizar manualmente uma planilha gigante e torcer para não cometer um erro de digitação. Esse tipo de automação é especialmente útil quando o cliente muda o escopo no meio do caminho. A empresa de engenharia pode recalcular o impacto em custos e em prazos com agilidade, apresentando ao cliente uma decisão fundamentada. As áreas de planejamento e suprimentos deixam de atuar às cegas e passam a utilizar dados quase em tempo real. Isso aumenta a maturidade do projeto e reduz surpresas. Para muitas organizações, só esse ganho de eficiência já justifica a adoção de processos BIM e de integrações digitais.

“nossos desenhos evoluem para 3D, e pronto”

No que diz respeito à maturidade do modelo, não estamos mais na fase de “nossos desenhos evoluem para 3D, e pronto”. Agora, o avanço físico do modelo é baseado em informação: o que se chama de níveis de desenvolvimento (LOD – Level of Development) não se limita a “um modelo com geometria detalhada”. À medida que o projeto evolui, adicionam-se informações sobre materiais, especificações, métodos de instalação, custos e prazos. Chega-se ao ponto em que o modelo não é mais somente uma representação estética, mas efetivamente uma fonte única de verdade que guia o empreendimento em todos os aspectos.

Se esse processo é bem gerido, cada disciplina insere ou atualiza os dados que lhe cabem, e o resultado final é um ecossistema digital sem lacunas. Hoje, já se fala em LODs muito altos que chegam até a manutenção e operação, transformando o BIM em um pré-gêmeo digital (digital twin) da instalação, prontinho para receber dados de sensores reais e continuar sendo útil na fase operacional. Esse é o futuro inevitável de plantas industriais, onde o modelo digital não morre na entrega do projeto, mas se torna referência para manutenção, futuras expansões e análise de desempenho ao longo de décadas.

É claro que há desafios. Muitas vezes, a mentalidade da alta gestão ou de antigos executivos é a maior barreira, porque eles enxergam o investimento em BIM e captura de realidade como um custo desnecessário. Mal percebem que o custo real está em ficar remendando erros durante a obra ou produzindo toneladas de documentação inconsistente.

Há pesquisas da Dodge Data & Analytics (Dodge, 2019) que mostram reduções significativas de até 50% no retrabalho quando as empresas utilizam fluxos BIM de forma integrada. Não é pouca coisa. Em projetos de grande envergadura, isso significa milhões de reais economizados. Para não mencionar a parte de satisfação do cliente, que vê uma obra mais limpa, mais organizada e dentro dos prazos. O erro de muitos gestores é achar que o ganho não é tangível, mas ele é absolutamente mensurável em termos de horas de engenharia, ineficiência em obra, desperdício de material e até litígios contratuais que surgem quando as informações não batem.

Efeito Colateral

Um efeito colateral positivo da adoção desses processos é a evolução dos profissionais. As equipes, ao se verem diante de ferramentas mais avançadas e modelos inteligentes, tendem a ganhar uma visão mais sistêmica do projeto. Aqueles que antes se limitavam a “desenhar” detalhes podem se aprofundar na compreensão do funcionamento do todo. Isso gera profissionais mais completos, capazes de dialogar com outras disciplinas e com maior noção de custo e prazo. E, por incrível que pareça, isso é um ativo valioso para a empresa de engenharia, pois se torna menos dependente daquele “desenhista” ou “engenheiro” específico que guardava tudo na cabeça.

Agora, o conhecimento fica registrado no modelo, e a saída de um funcionário deixa de ser tão traumática. Claro que existem resistências, como o medo de perder “status” ou a insegurança em aprender novas ferramentas. Mas quem superar esses medos vai emergir muito mais relevante para o mercado, não apenas para a empresa em que trabalha.

Também é importante notar que a digitalização não se limita às fases iniciais de projeto. Hoje, vemos cada vez mais a adoção do chamado “BIM durante a construção”, onde o modelo serve de base para o planejamento e acompanhamento de obra. O famoso 4D, em que cada elemento do modelo está atrelado a um cronograma de execução. Assim, no canteiro, a equipe sabe não só o que precisa ser feito, mas quando e em que sequência. Se há um atraso num item crítico, é possível simular o efeito cascata e ver quais atividades serão impactadas.

Em obras industriais, especialmente aquelas cheias de etapas e subcontratadas, esse nível de gestão evita o efeito “todo mundo pisa nos pés uns dos outros”, tão comum quando civis, mecânicos e elétricos tentam trabalhar no mesmo espaço, sem um organograma bem definido. E se surgem dúvidas sobre a situação real do canteiro versus o modelo, drones podem ser utilizados para gerar mapeamentos fotogramétricos de alta frequência, confrontando o modelo planejado com a realidade. Isso abre a possibilidade de detecção rápida de desvios, em vez de esperar grandes marcos para descobrir que a execução não está alinhada ao projeto. É a lógica do “constrói virtual antes de construir físico” levada a um nível extremo de detalhamento e controle.

A zona

Há quem prefira continuar na zona de conforto, dizendo “já sabemos fazer assim há 30 anos, e o mercado sempre deu conta”. Mas a curva de adoção das tecnologias e processos BIM, somada às práticas de captura de realidade, vem crescendo de forma acelerada. Em alguns segmentos – como grandes projetos de infraestrutura no exterior – já é pré-requisito básico usar metodologias digitais.

Mesmo em países onde a construção ainda é tida como conservadora, a pressão dos donos de projeto e financiadores tende a empurrar a adoção de fluxos modernos, pois não faz sentido insistir em técnicas que arriscam milhões de reais. Inúmeros governos e empresas privadas passaram a exigir BIM em contratos de médio e grande porte (buildingSMART, 2020). E uma empresa que não se adeque a isso será vista como amadora ou limitada. O recado é claro: ou você se reinventa, ou acaba executando projetos pequenos, sem tanta relevância, e em breve fica completamente fora do jogo.

A automação de engenharia, vinculada a essas plataformas, extrapola ainda mais as fronteiras. Se pensamos em pré-fabricação e modularização, dois conceitos-chave para a indústria moderna, a sinergia com BIM é incrível. Em vez de improvisar módulos e pré-fabricados, o projeto digital detalha cada componente que será produzido em fábrica, e o canteiro recebe “peças” já montadas, que se encaixam na estrutura com precisão milimétrica. Menos mão de obra em campo, menos risco de erro, mais velocidade. As empresas que dominam esse fluxo conseguem executar obras complexas em prazos que pareciam impossíveis.

Drones são usados para verificar a chegada dos módulos, garantindo que a montagem esteja no local exato. Laser scanners confirmam alinhamentos e nivelamentos. Não há a figura do “arruma aqui, bate marreta ali” por puro empirismo. Tudo é planejado e monitorado digitalmente. O canteiro, que antes era o palco de correções improvisadas, vira quase uma linha de montagem eficiente. E se algo não encaixa, é porque houve falha no modelo ou nos processos de fabricação – mas essa falha tende a ser identificada muito antes de chegar ao campo, justamente pela checagem virtual.

Comercial

Do ponto de vista comercial, a empresa de engenharia que oferece esse pacote – BIM integrado, automação de projeto, captura de realidade e gestão de dados – consegue justificar honorários mais elevados, pois agrega valor real ao cliente. O famoso “serviço de engenharia” deixa de ser visto como commodity (onde se disputa para ver quem faz mais barato) e passa a ser encarado como fator estratégico que pode economizar milhões durante a execução e a operação.

Há relatos de grandes players que escolheram um fornecedor de engenharia por este dominar metodologias digitais, mesmo cobrando mais, porque no cômputo final, isso reduz o custo global do empreendimento. O que isso significa? Que a “era do barateamento” da engenharia só continua para quem não oferece nada além de desenhos. Quem consegue provar competência digital passa a ser disputado e ganha contratos mais rentáveis. É uma mudança de jogo completa, onde a competência técnica se soma à fluidez digital, criando um diferencial competitivo que os clientes conseguem enxergar de imediato.

Podemos ir além e pensar que, após a obra finalizada, esse modelo rico em informações pode se transformar no gêmeo digital (digital twin) da planta. O conceito de digital twin tem ganhado força, pois permite que a operação seja acompanhada em um modelo virtual conectado por sensores IoT, e que a manutenção seja planejada com base em dados reais de desempenho. Para a empresa de engenharia, isso abre oportunidades de contratos de suporte contínuo, atualizações de projeto e serviços de otimização ao longo do ciclo de vida do ativo.

Em vez de abandonar o projeto no momento em que a obra termina, pode-se continuar prestando consultoria e evoluindo o modelo conforme mudanças ocorrem na planta. O dono da instalação, por sua vez, tem um retrato digital sempre atualizado, facilitando expansões futuras ou adequações regulatórias. Tudo isso depende de uma base sólida de informação construída lá atrás, quando se decidiu adotar processos BIM e captura de realidade em vez de meras representações 2D. Algumas empresas hesitam, pois “não querem investir tanto tempo e energia” no início. Mas, na era atual, quem faz esse investimento colhe frutos de longo prazo, tanto financeiros quanto em termos de reputação.

Agora, é bom ressaltar que não basta “falar em BIM” ou “comprar um scanner”. É preciso desenhar o processo de implantação com seriedade. Tão importante quanto o software são os padrões de nomeclatura, classificação, níveis de informação a cada fase, fluxos de aprovação e responsabilidades de cada disciplina. Sem essa organização mínima, tudo vira uma bagunça digital.

Da mesma forma, comprar um laser scanner ou um drone top de linha não resolve se não houver pessoal capacitado para processar a nuvem de pontos ou as imagens capturadas, limpá-las, registrá-las e integrá-las ao modelo. A tecnologia é poderosa, mas precisa de método para brilhar. Talvez esse seja o principal obstáculo para empresas que tentam “dar o salto” sem planejar: elas mergulham em ferramentas sofisticadas e se perdem na falta de padronização. Por isso, a adoção bem-sucedida costuma envolver uma consultoria especializada ou um núcleo de inovação interna capaz de definir protocolos claros e treinar as equipes.

A era está chegando ao fim

Por fim, vale deixar claro que a provocação aqui não é para alimentar o fetiche tecnológico ou pintar o BIM, a automação de engenharia e a captura de realidade como panaceias milagrosas. Há certamente curvas de aprendizado, investimentos e possíveis percalços. Porém, a questão essencial é que, do outro lado, está um mercado em transformação, impaciente e exigente, que não tolera mais os velhos vícios e atrasos. Todas as pesquisas e estudos de caso de entidades como buildingSMART, National Institute of Building Sciences (NIBS) e Deloitte apontam para o mesmo caminho: a adoção de processos digitais integrados reduz custos de projeto, cronogramas de obra e riscos contratuais, ao mesmo tempo em que aumenta a qualidade geral do empreendimento.

Se sua empresa de engenharia se recusa a enxergar isso, inevitavelmente perderá relevância para quem topou o desafio de evoluir. E, ao contrário do que muitos pensam, não é preciso ser um gigante do mercado para adotar essas práticas. Pequenas e médias empresas de engenharia podem, sim, começar de forma incremental, selecionando um projeto-piloto, investindo em capacitação e mostrando resultados concretos. O que não se pode é continuar sentado, esperando que o cliente aceite metodologias do século passado e pagando cada vez mais caro pelos erros que isso acarreta.

O recado final é duro, mas necessário: a era dos “desenhos” está acabando. O mundo da engenharia industrial caminha a passos firmes para uma convergência de BIM, captura da realidade, automação e gestão de dados totalmente digital. Ninguém mais se satisfaz com meras plantas estáticas e “achismos” em campo. A busca é por uma engenharia que entregue transparência, previsibilidade e agilidade. E quem não oferecer isso corre o risco de ficar falando sozinho. Do jeito que as coisas estão indo, a capacidade de atualização e inovação definirá o destino de muitas empresas: ou elas adotam esses fluxos integrados, ou entram num gradual declínio até sumirem do horizonte competitivo. Talvez soe dramático, mas basta olhar para fora, para mercados em que isso já é mandatório.

O futuro não manda aviso. Ele simplesmente chega, e quem não estiver pronto é deixado para trás. A boa notícia é que a transformação, embora complexa, é viável. Exige planejamento, mudança cultural, adoção de ferramentas potentes e gente disposta a aprender. E quem trilhar esse caminho passa a ter um diferencial gigantesco, entregando projetos mais acertados, obras menos problemáticas e relacionamentos de longo prazo com clientes que percebem o valor dessa competência. Essa é a nova regra do jogo: modelos ricos em dados, integrados em todas as etapas, sustentados por captura de realidade e automação. Isso é o que, cada vez mais, separa as empresas de engenharia que prosperam daquelas que caminham para a irrelevância.

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Especialista em escaneamento à laser, fotogrametria e drones sócio proprietário da GENIA. Desde 2008 atuando em projetos de engenharia industrial e de infraestrutura.

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